Empresário é baleado, confundido com assaltante e preso em Fortaleza: 'Maior sofrimento que tive'
Imagens mostram empresário sem ferimentos após horário de confronto policial Após ser baleado na mão enquanto estava na rua, um empresário foi preso duran...

Imagens mostram empresário sem ferimentos após horário de confronto policial Após ser baleado na mão enquanto estava na rua, um empresário foi preso durante atendimento na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), em Fortaleza. Ele se tornou suspeito de ter participado de uma tentativa de latrocínio. E foi solto depois de duas semanas, após a defesa apresentar evidências de que ele havia sido baleado em outra situação. O caso aconteceu no dia 9 de setembro. No dia 23 de setembro, a Justiça aceitou o pedido de relaxamento da prisão de Francisco Henrique Santos de Almeida, de 27 anos. Ou seja, a prisão foi considerada ilegal, mas ele continua tendo que provar que não é um dos assaltantes envolvidos no crime. ✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 Ceará no WhatsApp Neste período de duas semanas, o empresário chegou a dividir cela com cerca de 45 pessoas no Complexo Penitenciário de Aquiraz. Ele relata ter precisado dormir em pé e ter tido dificuldades para conseguir atendimento médico (confira o depoimento abaixo na reportagem). De acordo com a defesa, Henrique Santos foi vítima de uma bala perdida no bairro Vila Velha. Depois, ele foi confundido um dos com assaltantes que haviam trocado tiros com a polícia no mesmo dia, após praticarem uma série de assaltos e uma tentativa de latrocínio. LEIA TAMBÉM: Homem preso injustamente por estupro é solto quatro anos após condenação, no Ceará Cearense que ficou 5 anos preso por engano comenta prisão de verdadeiro estuprador 11 anos após crimes: 'Ainda sinto falta de justiça' Homem passa 1 ano e meio preso injustamente em SP após reconhecimento por foto; estado é condenado a pagar R$ 350 mil Os dois eventos aconteceram em horários diferentes. Por volta das 16h, assaltantes e policiais entraram em confronto e trocaram tiros na avenida Leste-Oeste. Henrique foi atingido na mão nas proximidades da rua Beta, no bairro Vila Velha, por volta das 19h. Imagens de câmeras de segurança foram apresentadas pela defesa para mostrar que, entre 16h e 19h12min, o empresário foi filmado em diferentes estabelecimentos comerciais sem estar ferido ou apresentar sangramentos ou desconforto físico. Como dono de três galeterias em bairros diferentes de Fortaleza, ele se deslocou entre as unidades durante a tarde e o início da noite. Cronologia Imagens de um estacionamento mostram o empresário sem ferimento nas mãos pouco depois das 18h Reprodução As evidências apresentadas pela defesa de Henrique mostram uma linha do tempo em que o empresário é filmado sem ferimentos em horários posteriores ao confronto entre policiais e assaltantes na avenida Leste-Oeste, no dia 9 de setembro. Confira a cronologia dos eventos apresentada pela defesa do empresário: 16h: Suspeitos de assaltos e tentativa de latrocínio na avenida Leste-Oeste são perseguidos e trocam tiros com policiais. Segundo a defesa, o empresário encerrava, neste horário, as atividades em uma de suas galeterias, no bairro Jardim das Oliveiras. 17h53: Henrique é filmado em um estacionamento na avenida Tristão Gonçalves, no Centro. Nas imagens, ele aparece sem ferimentos. 18h11: O empresário é filmado no mesmo estacionamento, ainda sem ferimentos. 18h50: Henrique vai até a galeteria no bairro Vila Velha, acompanhado do sócio Carlos Dyego Almeida. Na calçada da rua Beta, ele é atingido na mão por uma bala perdida. 19h12: O empresário e o sócio são filmados dentro de uma farmácia na avenida Mozart Pinheiro de Lucena, no bairro Vila Velha. Nas imagens, ele aparece com um curativo na mão esquerda. 20h: O sócio leva Henrique para atendimento para a UPA do Cristo Redentor. 21h48: Henrique recebe voz de prisão dentro da UPA do Cristo Redentor. Segundo os advogados Rayssa Mesquita e Teodorico Menezes, o empresário foi baleado quando estava no bairro Vila Velha ajudando a encerrar o expediente de uma das suas galeterias. “Ele tá na calçada, conversando com o sócio [da galeteria]. Passa uma moto, uma movimentação, e ele escuta o tiro. Quando ele escuta o tiro com o sócio, ele corre para dentro da galeteria para se esconder e vê que levou um tiro de raspão na mão”, explicou ao g1 a advogada Rayssa Mesquita. As câmeras de segurança de uma farmácia nas proximidades foram apresentadas à Justiça no pedido de relaxamento de prisão. Imagens de farmácia mostram empresário fazendo curativo na mão após 19h Nelas, Henrique aparece com a mão ferida. Conforme a defesa, ele foi até o local para fazer um curativo e recebeu orientação para procurar a UPA. O empresário e o sócio Carlos Dyego teriam tentado evitar a UPA do Vila Velha por considerarem que a unidade é mais lotada. Em vez disso, foram até a UPA do Cristo Redentor, que fica na mesma avenida em que assaltantes e policiais haviam trocado tiros durante a tarde. “Quando ele [Henrique] chegou na UPA, o médico atendeu na triagem e pediu para que ele fosse submetido a um raio-X. Quando ele saiu do raio-X, ele já estava com o policial o prendendo em flagrante delito pela prática de uma tentativa de latrocínio”, explicou a advogada. O empresário aparece em imagens de uma farmácia com ferimento na mão pouco depois das 19h Reprodução Assaltos e latrocínio Conforme relatos dos policiais, quatro criminosos haviam praticado uma série de assaltos nas cidades de Fortaleza e Caucaia utilizando um carro modelo HB20, no dia 9 de setembro. Eles também teriam atirado contra uma das vítimas, configurando a tentativa de latrocínio. A vítima era uma mulher que foi abordada pelos criminosos no bairro Dom Lustosa, em Caucaia. Os assaltantes pegaram o celular e um cartão da vítima. Ao se recusar a entregar um tablet, a mulher teve os cabelos puxados e foi jogada no chão. Um dos criminosos atirou contra ela, mas ela não foi atingida. Após perseguição policial na avenida Leste-Oeste e troca de tiros por volta das 16h, o condutor do carro foi preso em flagrante. Um segundo suspeito foi encontrado na comunidade do Oitão Preto, no bairro Moura Brasil, com um ferimento na perna. Um terceiro ocupante do carro conseguiu fugir. Os policiais suspeitaram que Henrique estivesse envolvido na ação após dar entrada na UPA com lesão de disparo de arma de fogo. Conforme a defesa do empresário, os policiais afirmaram que a vítima da tentativa de latrocínio reconheceu Henrique como um dos envolvidos na ação. De acordo com Rayssa Mesquita, não ficou claro como foi feito esse reconhecimento dele pela vítima. Ela aponta que houve falha no procedimento, que deveria ter sido feito com a apresentação do suspeito ao lado de pessoas que tivessem semelhança física, após uma descrição detalhada feita inicialmente pela própria vítima. Duas semanas na prisão Imagens de empresário preso ao ser confundido com assaltante auxiliaram no pedido de relaxamento de prisão Reprodução Henrique ficou detido na Delegacia de Capturas, em Fortaleza, até passar pela audiência de custódia, no dia 11 de setembro. Ele foi ouvido por um juiz juntamente com outras duas pessoas que haviam sido presas pela participação na tentativa de latrocínio. Na audiência, o magistrado decidiu converter a prisão em flagrante dos três em prisão preventiva. Segundo Rayssa, um dos suspeitos negou participação no caso durante a audiência. Outro deles afirmou que era motorista de aplicativo e que havia aceitado a corrida solicitada pelos criminosos, sendo ameaçado por eles para dirigir enquanto o grupo praticava os assaltos. “O motorista do veículo, que realmente confessa que estava dirigindo o veículo, confirmou que o Henrique não é uma pessoa que fazia parte daquelas pessoas que estavam lá dentro [do carro]”, acrescenta a advogada. Após a audiência, Henrique foi levado para o Centro de Triagem e Observação Criminológica, no Complexo Penitenciário de Aquiraz. O local recebe presos das delegacias de Fortaleza e funciona como uma porta de entrada para o sistema penitenciário da capital. “O maior sofrimento que tive em 27 anos de vida. Passei por algo bem desumano, coisa que eu só via em filme e que, do nada, aconteceu comigo”, relatou Henrique ao g1. Conforme a defesa, o período em que Henrique ficou na unidade coincidiu com as prisões de mais de 50 suspeitos de envolvimento com facção criminosa e de participação em queimas de fogos massivas para intimidação de grupos rivais, levando a uma superlotação. “Humilhação sem tamanho, dormindo em uma pedra com quatro presos com as pernas entrelaçadas. [...] Passei quatro dias dormindo em pé próximo ao tanque de água. [...] Só tínhamos direito a um short e uma blusa, sem direito a mais nenhuma roupa. Tinha que lavar e vestir ela molhada. É uma situação que não desejo nem pro meu pior inimigo”, afirmou. O empresário afirma que precisou de medicamentos para tratar de uma infecção na mão que havia sido baleada, tendo conseguido atendimento somente após pressão dos advogados. No tempo em que ficou preso, ele também afirma não ter conseguido comemorar o aniversário de cinco anos da filha. “Perdi momentos importantes da minha vida, como o tão sonhado e planejado aniversário da minha filha. Nada poderá reparar o que passei nesses dias, nem devolver o tempo perdido ou apagar o sofrimento”, acrescentou. Relaxamento da prisão O relaxamento da prisão de Henrique Santos foi concedido em decisão da 3ª Vara Criminal de Caucaia, no dia 23 de setembro. O alvará foi cumprido no dia 24 de setembro, quando o empresário deixou a prisão. Apesar de estar em liberdade, Henrique ainda terá que apresentar defesa por ter sido denunciado pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), juntamente com outros dois suspeitos de participação no latrocínio, que seguem presos. Na fase atual do processo, a defesa de Henrique reúne elementos para responder à acusação apresentada pelo MPCE. A expectativa dos advogados é que, com as evidências sobre a ilegalidade da prisão do empresário, a Justiça rejeite a denúncia e decida pela absolvição sumária — encerrando o processo criminal sem a necessidade de um julgamento. Assista aos vídeos mais vistos do Ceará: